quarta-feira, 9 de abril de 2008

Cavaco Silva recusa que o envelhecimento da população seja considerado "uma ameaça" ou "um fardo" para a sociedade

O Presidente da República, Cavaco Silva, recusou ontem que o envelhecimento da população seja considerado "uma ameaça" ou "um fardo" para a sociedade.

"Não é o facto de estarmos a falar de pessoas mais idosas que nos deve impedir de as considerar também como parte das soluções", disse Aníbal Cavaco Silva, em Lisboa, na sessão "O Tempo da Vida", organizada no âmbito do Fórum Gulbenkian de Saúde. "É precisamente por se tratar de pessoas que não devemos tomá-las apenas como um número, um custo, um encargo", acrescentou.

O Chefe de Estado falou depois do caso das empresas e da sua "obsessão sobre o contínuo rejuvenescimento dos seus trabalhadores", questionando-se se essa opção "traduz sempre um ganho efectivo de eficiência" ou se não contribuirá para "um défice de identidade de cultura organizacional e, mesmo, de rentabilidade". Recorrendo a estatísticas, Cavaco Silva disse que, a "manterem-se as actuais tendências", a populaçãoo com mais de 65 anos representará, daqui por cerca de 40 anos, em 2050, um terço do total da população portuguesa. Isto apesar de estar previsto que, dentro de dois anos, Portugal atinja o seu máximo histórico populacional, 10,6 milhões de habitantes, e ter, nessa altura, uma percentagem de pessoas com mais de 65 anos de cerca de 18 por cento do total. Feitas as projecções, em meados deste século a população nacional terá baixado 1,3 milhões de pessoas, para cerca de 9,3 milhões, e os idosos atingirão 32 por cento desse número. Em 2050, prosseguiu, o actual indíce de envelhecimento quase se multiplicará 2,5 vezes, passando dos actuais 108 para 243 idosos por cada 100 jovens.

"Trata-se de uma alteração profunda da estrutura demográfica, que exige das próximas gerações novas formas de encarar o envelhecimento", advertiu. Isso implica "falar de novos estilos de vida e de não continuarmos a tentar enfrentar os problemas do século XXI com as soluções do século XX". Tanto mais que o envelhecimento populacional, prosseguiu, "representa um desafio cujos contornos e impactos estão longe de ser devidamente identificados e avaliados".
"Duvido que a opinião pública e os cidadãos portugueses estejam suficientemente informados e conscientes das dimensões desse desafio, dos problemas que levanta, dos processo de mudança que exige", confessou o Presidente da República. Salientando que "neste, como em tantos outros domínios, não é por falta de leis que o país não avança", Cavaco Silva admitiu que que "seja mais por falta de iniciativa, escassez de espírito empreendedor" e pela "dificuladade" que a sociedade encontra em se libertar da "dependência do Estado".

Retirado de Lusa

1 comentário:

Ana Filipa Dâmaso disse...

O Envelhecimento Demográfico e seus Desafios à Sociedade e aos Governos

Constituindo uma temática amplamente relevante, o envelhecimento demográfico deverá constituir a acepção de uma condição ou fenomologia existencial, viabilizando uma profunda e completa análise de todo o tecido social de uma dada população, indagando o suficiente número de aplicações práticas e teóricas, bem como, de medidas de bem-estar promovidas por todos e por cada um.
Neste âmbito, a concreta definição de envelhecimento demográfico, deverá entender-se mediante uma perspectiva obrigatoriamente colectiva, tendo sempre em conta certas e determinadas particularidades de índole individual, permitindo-nos, agora e sempre, “viver mais tempo, mas viver melhor”, tendo em conta todas as directrizes humanas, psicológicas, biológicas, económicas, políticas e sociais, dando, obviamente, relevo às inquietações e incongruências decorrentes dessa mesma condição.
Assim, e contrariamente ao que habitualmente se defende, o envelhecimento demográfico deverá contemplar, não apenas, o aumento relativo das pessoas que atingiram 65 ou mais anos, mas antes, e complementarmente relacioná-lo com o relativo decréscimo de pessoas com idades mais jovens.
Nesta perspectiva e tendo em conta o panorama demográfico actual poderemos afirmar que do ponto de vista analítico a tradicional pirâmide etária, acentua crescentemente a sua deformação de contornos, tendo a tornar-se perfeitamente irreconhecível e rapidamente invertida.
No que se refere à população portuguesa revela-se um crescente alargamento do topo da pirâmide o que se traduz num efectivo aumento do número de pessoas idosas (estatisticamente consideradas todas as pessoas com 65 ou mais anos), contrariamente ao constante estrangulamento da base que reflecte a relativa diminuição de crianças e jovens.
Esta situação permite-nos indagar a emergência de um duplo envelhecimento a nível demográfico o qual se justifica não apenas pelo crescente aumento da esperança média de vida (envelhecimento no topo), como também pelo acentuado decréscimo da taxa de fertilidade e de natalidade (envelhecimento na base).
Efectuando um estudo comparativo entre a taxa de crescimento anual da população total e a população com 65 e mais anos entre 1950 e 2050 podemos verificar que até à década de 80 ambos os valores se mantiveram constantes, tendo a partir do ano de 2000 sido registado um acentuado declínio da taxa de crescimento anual da população total, verificando-se, contrariamente, um exponencial aumento da população com 65 e mais anos.
Tendo em conta uma análise mais extensiva do panorama demográfico nacional torna-se relevante indagar a perspectiva inerente ao contexto europeu e efectuar algumas conclusões comparativas.
Relativamente à percentagem de pessoas com 65 e mais anos torna-se perceptível a liderança de toda a malha Europeia a qual regista 15,6%, tendência que persiste em continuar ao longo do presente século, estimando-se que atinja 24,5% em 2030.
Em 1996 o número de pessoas idosas em Portugal era de 14,9% contra 15,8% da União Europeia, em 2001 e de acordo com registos provenientes de estudos censitários existiam em Portugal 16,4% de pessoas idosas para um universo de apenas 16,0% de crianças e jovens.
De acordo com estudos realizados em 2003 volta a registar-se um acentuado acréscimo de pessoas idosas, o que se traduz num aumento percentual de quase 1%.
Em Espanha o número de pessoas idosas é de cerca de 6 milhões, constatando-se que dentro de 25 anos seja de 9 milhões, o que se traduz a nível de percentagens num valor semelhante ao, anteriormente, referido para a população portuguesa, embora, todavia, sejamos um país muito mais pequeno, conjunturalmente inerte e estruturalmente deficitário.
Relativamente ao fenómeno em questão torna-se, igualmente relevante, destacar a divergência registada relativamente ao processo de envelhecimento em termos de género, nomeadamente no que se refere à predominante “tendência feminista” aquando do estádio particular de velhice.
A este respeito o fenómeno de feminização da população portuguesa é bastante notório, o que se traduz num aumento da esperança média de vida de forma desigual para homens e mulheres, privilegiando o sexo feminino. A este respeito as projecções apontam que para o ano de 2050 a esperança média de vida registe um aumento significativo, sendo de 84,1% para as mulheres e de 77,9% para os homens.
Este quadro projectivo da condição demográfica humana permite-nos concluir que o envelhecimento demográfico da população é uma realidade viva que necessita de ser avaliada mediante um fenómeno colectivo, mas sobretudo individual.
É necessário adaptar um conjunto de equipamentos, reestruturar o sistema de saúde, adaptar as políticas de protecção e segurança social, assegurar a subsistência, bem como, a sustentabilidade do sistema, desmontando a imagem homogeneizada e padronizada que a sociedade acarreta relativamente à concepção de pessoa idosa.
É fundamental que os direitos deixem de ser puros conteúdos manifestos, ou promessas de troca, que as incongruências da ignorância de muitos políticos deixe de existir e dê lugar a cidadãos informados e conscientes, capacitados a criar um progressivo estado de bem-estar, onde os direitos e as adaptações conjunturais permitam a realização de obras de vida.
A questão do envelhecimento humano exige que todos se integrem das condições existenciais das populações, preparando o mundo para a constante, consecutiva e normalizada inclusão da pessoa idosa como ser único, válido, pessoal e singular.
Neste sentido a questão do paradoxo do desenvolvimento e da modernização actualmente defendido por vários autores toma aqui grande relevo, pois se por um lado o envelhecimento traduz uma melhoria quantitativa e qualitativa da condição humana, por outro integra novas dimensões e desafios sociais, económicos, biológicos, políticos e culturais, exigindo constantes mutações e adaptações às sociedades e aos governos.
Constituindo uma base de sustentação e delimitação da condição existencial demográfica em Portugal, a política social dirigida à população idosa deverá adequar-se à realidade, repensando o actual sistema em toda a sua amplitude, em todo o seu trajecto, de modo pluridisciplinar e interdisciplinar, criando verdadeiras políticas que sustentem o vivo do sujeito, tendo em conta a diversidade de cada pessoa como ser único e singular.
Deverá assim, dar-se em cumprimento alguns princípios da Assembleia Geral das Nações Unidas os quais referem que as pessoas idosas devem ter possibilidade de viver em ambientes seguros, adaptados às suas preferências pessoais e às suas capacidades e que as pessoas idosas devem ter acesso a meios institucionais apropriados que lhes proporcionem protecção, reabilitação, estímulos sociais e mentais em ambiente humano seguro.
A inversão da pirâmide etária traduzida num duplo envelhecimento deverá permitir a configuração planeada de uma sociedade tolerante, permissiva e não castradora, possibilitando que todos se sintam cidadãos activos, plenos de vida e de sentimentos.
É necessário desconstruir ideias formatadas, alterar representações socioculturais e erradicar a prática ou a conceptualização de profecias auto-cumpridas.
O explosivo envelhecimento demográfico deverá comprometer intrinsecamente a revolução de todo o quadro social, viabilizando a crescente mutação de trocas, bem como, de expectativas.
Os desafios que se colocam deverão contemplar todo o manancial organizativo da vida social, viabilizando a alteração de mentalidades, a adaptação de políticas, bem como, a reconfiguração dos serviços públicos e privados, promovendo a organização de formações, cursos de preparação para a reforma, alternativas de desempenho pessoal e profissional, realização de projectos de vida, assim como, reestruturação do conceito de família, nomeadamente da tão conturbada “geração sandwiche”.

Autora: Ana Filipa Cristóvão da Silva Dâmaso